terça-feira, março 23, 2010

Câmbio e a Especulação Financeira

Muitas vezes -- recentemente, em especial -- vejo que alguns articulistas econômicos têm adotado um tom mais crítico no que se refere aos ganhos financeiros da especulação financeira.

O principal alvo tem sido o câmbio.

Em geral, o argumento que se escuta é de que a economia estaria sendo afetada por conta da apreciação cambial decorrente, em última análise, do grande ingresso de capital especulativo. De certa forma, a crítica está sendo direcionada a um suposto descolamento da esfera financeira em relação à economia produtiva.

Em parte (na passagem que atribui o movimento de apreciação ao forte ingresso de capital), podemos dizer que esse tipo de argumento é válido. Porém até que ponto podemos dizer que essa apreciação é prejudicial à economia? E mais, até que ponto podemos dizer que esse movimento cambial se sustentaria caso fosse prejudicial ao país? Mas, talvez, a pergunta mais relevante seja "até que ponto podemos considerar que o movimento cambial se descola dos fundamentos?"

Portanto, respondendo as perguntas,

(i) Até que ponto podemos dizer que esse movimento cambial se sustentaria caso fosse prejudicial ao país?
RESP.: Por mais que movimentos cambiais sejam entendidos como ruins -- sejam eles caracterizando a moeda como subvalorizada ou sobrevalorizada (em relação ao estado de equilíbrio) --, estes estados não podem se manifestar eternamente. Algum ajuste, portanto, deve ocorrer (seja via contenção da demanda interna, da externa ou do próprio câmbio retornando ao seu estado de equilíbrio).

(ii) "Até que ponto podemos considerar que o movimento cambial se descola dos fundamentos?"
RESP.: O câmbio é um preço que, como qualquer índice, é regido pelas forças do mercado (oferta e demanda). Dessa forma, os movimentos cambiais são meros reflexos dos desejos econômicos. Ou seja, se existem movimentos especulativos (no curto-prazo) que induzem grande volatilidade e incerteza com relação aos movimentos cambiais, no longo-prazo a trajetória cambial está intrinsecamente definida pelos fundamentos. Em outras palavras, se existem movimentos de curto-prazo atuando na contra-mão dos fundamentos, aqueles que apostarem, no longo-prazo, contra o que indicam os fundamentos certamente perderiam. Dito isso, é fácil de imaginar que movimentos de curto-prazo são meros desvios daqueles de longo-prazo. Agora sim...respondendo à pergunta, especuladores estão presentes no curto-prazo, mas não detêm força o suficiente para impedir a trajetória de longo-prazo embutida pelos fundamentos.

(iii) Até que ponto podemos dizer que essa apreciação é prejudicial à economia?
RESP.: Tendo lido as respostas das perguntas acima, fica fácil identificar qual seria minha resposta. Basicamente, essa resposta depende de qual perspectiva temporal que o setor produtivo usa em seu negócio. Aqueles que se debruçam sobre o longo-prazo não seriam afetados. Já a parcela do setor produtivo que depende dos movimentos de curto-prazo, alguns possívelmente seriam afetados, mas seria natural esperar que o ambiente criar seus mecanismos de defesa. Ou seja, se uma empresa depende dos movimentos cambiais de curto-prazo, para sobreviver seria de imaginar que ela buscaria, por exemplo, um hedge. Olhando de uma perspectiva distinta, se uma economia tem grande parcela de suas empresas vinculadas ao setor externo, movimentos de apreciação cambial tenderiam a elevar sua exposição aos competidores internacionais levando muitas delas à falência. Mas, também seria de se esperar que muitas delas aprimorassem sua produtividade e/ou redirecionassem suas vendas para o setor interno. Naturalmente o grau de exposição da economia ao setor externo seria reduzido auxiliando na contenção dos efeitos adversos de tais movimentos.

Em outras palavras, precisamos olhar para a economia como um organismo vivo que se modifica conforme as necessidades e exigências do ambiente. A economia é um organismo que se modifica para se equilibrar.