sexta-feira, junho 29, 2012

A aparente contradição entre baixo desemprego e baixo crescimento do produto

Associar baixas taxas de desemprego a um ambiente com baixas taxas de crescimento do PIB parece um resultado estranho. Tal constatação pode parecer estranha especialmente para economistas que estão acostumados a uma dinâmica positiva entre produção e taxa de desemprego.


Algumas teorias, que tentam explicar essa aparente contradição identificada no Brasil desde o início da crise dos subprimes, têm sido enunciadas por diversos economistas. Duas me chamaram a atenção:


(1) Fatores da oferta do mercado de trabalho (não me recordo quem teria levantado essa hipótese): A redução da taxa de desemprego --  U/(E+U) -- tem sido mascarada pelas diferentes taxas de crescimento das outras variáveis relevantes para sua formação -- População em Idade Ativa (PIA) e da taxa de participação.


(2) Realocação de recursos entre setores da economia:

(2.1) (Monica Baumgarten de Bolle) Seria uma questão estrutural, resultado de uma análise da Fronteira de Possibilidades de Produção (FPP) da produção do país, indicando que o Brasil estaria se especializando no setor de Serviços. Ou seja, que estaríamos nos movendo ao longo da FPP e, como resultado, o aquecimento do mercado de trabalho seria um mero reflexo de algum ponto fora da FPP -- porém, em rota de convergência à mesma --, realocando os recursos em favor de um setor. Como resultado, a indústria é penalizada.

(2.2) (Affonso Celso Pastore) A redução da Selic, que costuma ser mais sentida pela indústria, tem estimulado mais o setor de serviços. Isso ocorre, pois a crise dos subprimes/dívidas soberanas acaba mantendo a inflação sob controle, forçando a indústria tupiniquim a manter seus preços mais baixos, por produzir bens tradables que têm concorrência externa. Ou seja, como a indústria vê seus preços relativos ao setor de serviços ( tradables/non-tradables) cair, desestimulando a produção. Dessa maneira, mesmo com a indústria sendo mais penalizada por conta da crise "na gringa", dado o tamanho do setor de serviços, relativo ao da indústria, o impacto da contração do emprego industrial é dominado pelo crescimento do emprego de serviços -- que não sofre concorrência externa e tem sido privilegiado, seja pela política de expansão do consumo promovida pelo governo.


Concordo com todas as exposições acima, no entanto compro mais a histórica contada pelo Pastore (pra curto prazo, enquanto que a da Monica valeria para um prazo maior). "Deixe eu lhes dizer..." o por quê. Em poucas palavras, a 1a história e me parece mais estrutural e, portanto, tenderia a se manifestar num prazo mais longo. No caso da versão da economista Monica de Bolle, apesar de também parecer mais estrutural e, portanto, de mais longo prazo, me parece um movimento que já estaria em curso há um certo tempo, logo não seria necessariamente isso que estaria causando essa aparente contradição. A história do Pastore me parece mais coerente por se tratar de um movimento de prazo menor.

No entanto, creio que a explicação do Pastore ainda pode ser complementada com mais um detalhe importante e que casa com um fator já muito noticiado na mídia: a escassez da mão de obra qualificada no Brasil. Dentre os tipos de desemprego verificados (friccional, sazonal, cíclico e estrutural), o desemprego estrutural -- entendido como desequilíbrio entre oferta e demanda de mão de obra -- pode ser causado por conta da heterogeneidade da mão de obra, inviabilizando a mobilidade da mesma entre setores. Essa demora (ou inexistência) da mobilidade de recém desempregados de um setor para o outro, seria decorrência da demanda por tipos de diferentes skills em cada setor.

Parece razoável, portanto, dizer que a mobilidade de um setor para o outro é assimétrica por conta do requerimento mínimo em cada setor. Enquanto a indústria necessita de pessoas com um nível mínimo de qualidade técnica (para manuseio do maquinário, por exemplo), o setor de serviços não tem a mesma necessidade.

Dessa maneira, pensemos em dois cenários: (i) o setor de serviços se expande enquanto a indústria contrai -- acho que vi isso no noticiário outro dia!! -- e (ii)  o setor de serviços se contrai enquanto a indústria expande. Ou seja, cenários opostos. Dado a qualidade do contingente de mão de obra brasileira e o tamanho de cada setor, o cenário "i" sugere que parte dos desempregados da indústria poderiam ser absorvidos absorvidos pelo setor de serviços, amortecendo os efeitos sobre a taxa de desemprego. Já o cenário "ii" sugere que SE nosso setor de serviços estivesse em apuros, boa parte da mão de obra recém ingressa no desemprego não conseguiria ser absorvida pela indústria no mesmo tempo do cenário "i" por conta dos requerimentos mínimos da qualidade da mesma. Ou seja, essa contingente necessitaria, antes, de treinamento para se qualificar e, então, iniciar a busca por emprego no setor industrial.

Ou seja, por mais que os sinais de vida da indústria brasileira -- que aparenta ter atingido um novo patamar de crescimento, resultante, também, do chamado "Custo Brasil": elevado custo tributário; (falta de) infraestrutura em melhores condições; juros (ainda) elevados; resultado, dentre outros motivos, da baixa poupança do país; e baixa produtividade -- indiquem que a coisa realmente esta feia, lembrem-se que ela poderia ser pior!