O tema, como o próprio título do artigo expõe, envolve "poupança e investimento". O autor descreve, ao longo do artigo, quais seriam as principais diferenças entre o que é visto como um dos grandes focos de desentendimento entre correntes de pensamento ortodoxas e heterodoxas: a relação de causalidade entre poupança e investimento.
Para aqueles com pouca disposição de ler o artigo, eis meu resumo: Ortodoxos acreditam que a causalidade vai da poupança para investimento, enquanto que para heterodoxos ocorre o inverso (investimento para poupança).
Toda vez que surge esse tipo de discussão, sempre me vem a mente a história de 'Sexta-Feira' e 'Robinson Crusoe'. Essa história, que ocorre em uma economia de trocas (traduzindo do "economês" isso significa dizer que é um mundo em que não há dinheiro em forma de moeda e que as pessoas realizam seus negócios na base de trocas de bens -- uma maçã por uma manga, por exemplo), implica em uma condição, necessária, para que as trocas ocorram: a poupança. Em outras palavras, a poupança precede o investimento.
Para não dizerem que estou sendo injusto e deixando de lado argumento de ambos os lados, heterodoxos argumentam que emerge da dimensão tratada do problema, ou seja, o resultado no agregado é distinto daquele que tratamos no nível micro... Por favor, além de corrigir eventuais besteiras, peço que complementem a argumentação que aqui faltar.
Ainda assim, me parece distante que tal resultado seja identificado no macro e não no micro.
Além disso existe uma questão temporal que, de certa forma, culmina na necessidade de poupança. As decisões que uma pessoa toma visam o consumo imediato, mas também o consumo futuro! Esse detalhe torna a decisão de poupança simultânea as decisões de consumo corrente... mais que isso, é a decisão de poupar hoje que financia (e garante) o consumo de amanhã. Me parece, portanto, um tanto equivocado tratar a questão da poupança como residual.
Vale lembrar que pessoas de baixa renda (e que não tenham um estoque de riqueza para "queimar" em tempos difíceis) venham a consumir toda (ou quase toda) sua renda para manter um nível mínimo de consumo (consumo de subsistência) e que, dessa forma, não poupam nada (ou quase nada) de sua renda.
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Poupança e investimento
Antonio Corrêa de Lacerda*
A carência de poupança e investimento, ambos abaixo de 20% do produto interno bruto (PIB), entrou na ordem do dia do debate econômico brasileiro, especialmente tendo em vista a relativamente bem-sucedida e rápida saída da crise e as perspectivas concretas de retomada do crescimento.
Há uma evidência na economia de que para sustentar o crescimento é preciso garantir uma taxa de investimentos que proporcione uma ampliação da oferta, isto é, da infraestrutura e capacidade produtiva das empresas de forma a atender à elevação da demanda sem gerar gargalos e pressões inflacionárias, assim como a explosão do déficit externo pelo aumento das importações requeridas. Também fica claro que países que investem muito, como é o caso especialmente dos asiáticos, possuem elevadas taxas de poupança (de 30% a 40% do PIB).
No entanto, o que nem sempre é tão evidente é o que vem primeiro. Se os países que mais crescem o fazem porque foram capazes de gerar poupança para viabilizar o investimento ou, se ao contrário, a partir de taxas elevadas de crescimento isso puxou os investimentos e, consequentemente, a poupança. Para a macroeconomia ortodoxa a poupança é um pré-requisito para o crescimento. Isso exigiria anos, talvez décadas, para que se atingisse um nível ideal de poupança para financiar o investimento e o crescimento. Já para os heterodoxos é justamente a indução do crescimento acelerado que estimula o investimento, produz renda e, consequentemente, a poupança. Nesse segundo caso, a poupança é resultado do processo.
Há duas frentes de contribuições heterodoxas importantes nesse ponto, uma advinda da teoria e outra, da história de desenvolvimento econômico das nações. A contribuição teórica vem de John M. Keynes, cada vez mais citado na saída da crise, porém, ainda, infelizmente, muito pouco lido e interpretado. Para Keynes, ao contrário da ortodoxia convencional, a poupança não é um pré-requisito para o investimento e o crescimento econômico, mas justamente o oposto. Ou seja, o que estimula o "espírito animal" do investidor produtivo é uma expectativa firme de crescimento da demanda. Portanto, a palavra-chave no caso é a criação de fontes alternativas de financiamento e crédito que independam de uma poupança prévia, no sentido de privação do consumo. A viabilização do financiamento e do crédito propiciaria a criação de riqueza e geração de valor agregado, portanto, renda da qual uma parcela poderá se constituir em crescimento da poupança. A ressalva é importante porque muitas análises de inspiração ortodoxa apontam a carência de poupança como fator impeditivo do investimento e do crescimento.
Há uma evidência na economia de que para sustentar o crescimento é preciso garantir uma taxa de investimentos que proporcione uma ampliação da oferta, isto é, da infraestrutura e capacidade produtiva das empresas de forma a atender à elevação da demanda sem gerar gargalos e pressões inflacionárias, assim como a explosão do déficit externo pelo aumento das importações requeridas. Também fica claro que países que investem muito, como é o caso especialmente dos asiáticos, possuem elevadas taxas de poupança (de 30% a 40% do PIB).
No entanto, o que nem sempre é tão evidente é o que vem primeiro. Se os países que mais crescem o fazem porque foram capazes de gerar poupança para viabilizar o investimento ou, se ao contrário, a partir de taxas elevadas de crescimento isso puxou os investimentos e, consequentemente, a poupança. Para a macroeconomia ortodoxa a poupança é um pré-requisito para o crescimento. Isso exigiria anos, talvez décadas, para que se atingisse um nível ideal de poupança para financiar o investimento e o crescimento. Já para os heterodoxos é justamente a indução do crescimento acelerado que estimula o investimento, produz renda e, consequentemente, a poupança. Nesse segundo caso, a poupança é resultado do processo.
Há duas frentes de contribuições heterodoxas importantes nesse ponto, uma advinda da teoria e outra, da história de desenvolvimento econômico das nações. A contribuição teórica vem de John M. Keynes, cada vez mais citado na saída da crise, porém, ainda, infelizmente, muito pouco lido e interpretado. Para Keynes, ao contrário da ortodoxia convencional, a poupança não é um pré-requisito para o investimento e o crescimento econômico, mas justamente o oposto. Ou seja, o que estimula o "espírito animal" do investidor produtivo é uma expectativa firme de crescimento da demanda. Portanto, a palavra-chave no caso é a criação de fontes alternativas de financiamento e crédito que independam de uma poupança prévia, no sentido de privação do consumo. A viabilização do financiamento e do crédito propiciaria a criação de riqueza e geração de valor agregado, portanto, renda da qual uma parcela poderá se constituir em crescimento da poupança. A ressalva é importante porque muitas análises de inspiração ortodoxa apontam a carência de poupança como fator impeditivo do investimento e do crescimento.
(MAS O QUE SERIAM 'FONTES DE FINANCIAMENTOS' -- SEJAM ELAS ALTERNATIVAS OU NÃO? AFINAL DE CONTAS, PARA QUE O FINANCIAMENTO EXISTA ELE DEVE SER RESULTADO DE...?? OU ESTOU EQUIVOCADO?)
A segunda contribuição importante, esta advinda da análise da experiência de desenvolvimento dos países, denota que especialmente no caso asiático a hipótese keynesiana se confirmou. Ou seja, o que proporcionou o aumento do investimento e da poupança foi, além de aspectos culturais e históricos, o crescimento econômico acelerado induzido por forte participação do Estado e o estímulo de políticas macroeconômicas favoráveis.
Para o Brasil, por exemplo, sabidamente de baixa poupança, sair desse dilema será determinante para o futuro. Não há mais tempo a perder. É preciso ter o crescimento e o aumento do investimento como objetivos de política econômica e criar um ambiente favorável para o investimento privado.
O mercado de capitais, as fontes públicas de financiamento (BNDES, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, entre outros), o mercado financeiro, incluindo aí os fundos de pensão, os fundo mútuos e outros são importantes fontes de financiamento do desenvolvimento. O Brasil também tem uma experiência bem-sucedida de aproveitamento da poupança externa, especialmente o investimento direto estrangeiro para complementar suas necessidades.
As condições macroeconômicas são imprescindíveis, como câmbio competitivo, juros baixos e estrutura tributária adequada. Outro instrumento importante é a política de competitividade, leia-se política industrial, comercial e de inovação, que pode fomentar a geração de valor agregado local e exportações. O Brasil tem todas as condições de combinar ações que lhe sejam mais favoráveis ao desenvolvimento.
Para o Brasil, por exemplo, sabidamente de baixa poupança, sair desse dilema será determinante para o futuro. Não há mais tempo a perder. É preciso ter o crescimento e o aumento do investimento como objetivos de política econômica e criar um ambiente favorável para o investimento privado.
O mercado de capitais, as fontes públicas de financiamento (BNDES, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, entre outros), o mercado financeiro, incluindo aí os fundos de pensão, os fundo mútuos e outros são importantes fontes de financiamento do desenvolvimento. O Brasil também tem uma experiência bem-sucedida de aproveitamento da poupança externa, especialmente o investimento direto estrangeiro para complementar suas necessidades.
As condições macroeconômicas são imprescindíveis, como câmbio competitivo, juros baixos e estrutura tributária adequada. Outro instrumento importante é a política de competitividade, leia-se política industrial, comercial e de inovação, que pode fomentar a geração de valor agregado local e exportações. O Brasil tem todas as condições de combinar ações que lhe sejam mais favoráveis ao desenvolvimento.